Estrutura do Livro
Anatomia da Alma analisa a representação bíblica do homem como um ser criado à "imagem de Deus". As ideias principais do livro são extraídas dos ensinamentos do grande mestre chassídico Rebe Nachman de Breslav (1772-1810) e de seu discípulo mais próximo, o Reb Natan (1780-1844). A obra apresenta uma descrição da anatomia humana com seus análogos espirituais essenciais, com a finalidade de encorajar o leitor a realizar seu pleno potencial por meio da percepção do corpo como um templo para a alma. Seguimos a prática usual de dividir o corpo de acordo com sistemas fisiológicos, como faz a maioria dos livros de anatomia. No entanto, estruturamos nossa abordagem específica em conformidade com a nossa intenção de examinar a essência espiritual da anatomia humana.
A parte 1 introduz a noção de "anatomia espiritual", tomando a representação bíblica de Adão como protótipo de toda a humanidade. Discute também os conceitos de Adão no Jardim do Éden, a ingestão do fruto proibido da árvore do conhecimento do bem e do mal, a subsequente expulsão do Éden e o que ela significa para nós na atualidade.
A parte 2 detalha a necessidade do corpo e da alma de funcionarem juntos e em harmonia. A criação da alma e do corpo, sua interdependência e características fundamentais são discutidas aí. Muitos dos conceitos cabalísticos empregados em nosso texto são introduzidos nesta seção.
Na parte 3, começamos a investigar a constituição interna do corpo. Como será claramente demonstrado, o caráter da pessoa está enraizado na circulação sanguínea e no sistema digestório. Portanto, estes sistemas e órgãos serão analisados primeiro, para que possamos entender como os traços básicos de nossa personalidade se desenvolvem durante a infância. Explicaremos, por exemplo, as fontes da ira e da arrogância, e como se originam a avareza, a gula e a luxúria.
Em seguida, nas partes 4, 5 e 6, apresentamos os órgãos que podem ser usados para combater os desejos mais vis do homem. Entre eles, incluem-se os componentes do sistema nervoso central e os órgãos contidos na caixa torácica (o coração e os pulmões - sedes do intelecto e das emoções), que possuem os meios pelos quais o indivíduo pode aprender a compreender-se.
A parte 7 trata do sistema nervoso periférico, ramos do intelecto que nos dotam do potencial para controlar os próprios desejos e sublimá-los para nosso benefício espiritual.
Na parte 8, a discussão se concentra no sistema locomotor, que nos habilita a subir a escada espiritual, cada um de acordo com as suas habilidades singulares.
Na parte 9, examinamos o sistema reprodutor e abordamos, do ponto de vista espiritual, a pureza sexual, relações conjugais, concepção, gravidez e parto.
Finalmente, a parte 10 trata de questões como as razões pelas quais Deus viu a necessidade de criar o homem com um corpo físico e necessidades físicas, o propósito da morte e a ideia de recompensa final, o mundo vindouro, que pode ser experimentado mesmo neste mundo, pelo simples direcionamento de nossos esforços para a superação das aspirações materiais.
O apêndice A apresenta o texto completo da história "O Filho do Rei e o Filho da Criada", usada pelo Reb Natan como guia para o entendimento das respectivas funções de nossa natureza física e espiritual.
O apêndice B enumera as mitsvót específicas que se relacionam com os vários órgãos e membros, com base no Sêfer Charedim.
O apêndice C define em que sefirot se enraízam as características do homem, para que ele possa, da melhor maneira, empenhar-se por alcançar sua imagem Divina, trazendo um resumo dos ensinamentos do Tômer Devorá.
O apêndice D contém diagramas e outras representações visuais que ilustram os conceitos cabalísticos empregados em nosso livro.
[Esta edição em português apresenta ainda um apêndice E com o texto completo do Ticun Clali - N. E.]
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Estrutura do Livro
Prefácio
PARTE 1: A ALMA DA ANATOMIA
1. "À Imagem de Deus"
O que é a Torá? 21; Torá e Anatomia 22
2. No Jardim do Éden
PARTE 2: CORPO E ALMA
3. Deus e a Alma
Deus e Seus Nomes 32; Deus e a Alma Humana 36; O Espaço Esvaziado 38; Cinco Olamot e Dez Sefirot 39; Cinco Partsufim e Dez Sefirot 40; As Três Colunas 41; O Corpo Cósmico 42; Cinco Níveis da Alma 43; A Analogia do Vidreiro 44
4. O Corpo: uma Vestimenta com Duplo Propósito
Os Quatro Elementos 48
5. Traços de Caráter Positivos e Negativos
Os Quatro Servos 53
6. O Paradoxo de Corpo e Alma
"Façamos o Homem..." 59; Bom Conselho 60
PARTE 3: O SISTEMA DIGESTÓRIO
7. Introdução
8. O Processo de Purificação
Paciência 72; A Carruagem de Deus 74; Maravilha das Maravilhas 76
9. A Circulação Sanguínea
O Batimento Rítmico 78; Sangue "Quente" 79; Vitória ou Verdade 81; A Via Principal para o Arrependimento 83; ?Eu Serei? 85; Um Circuito de Alegria 86; Recicle-se e Retorne 87; O Álcool e a Árvore do Conhecimento 89; Exame de Sangue 90
10. Alimentação: o Exílio no Egito
A Boca, os Dentes e o Estômago 93; "O Estômago Dorme" 95; Sonhos Doces 97; Comer como Mitsvá 98; Comer com Consciência 99; Alimento Espiritual 100
11. O Fígado, a Vesícula Biliar e o Baço
Introdução 103; Escravidão no Egito 105; O Fígado 107; Ira e Orgulho: O Elemento Fogo 109; Orgulho e Humildade 110; Ira e Irritabilidade 111; Amor e Ódio 112; A Vesícula Biliar 113; Um Pouco de Amargo(r)... 114;
... e Paz 115; O Baço 115; A Sede da Depressão 115; Avareza: Obsessão e Inveja 116; O Baço Ri 117
12. Purificação de Corpo e Alma
Sangue, Suor... 120; ... e Lágrimas 122; Esaú versus Lea 122; Os Rins 123; A Árvore do Conhecimento 124; O Resultado "Final" 126; Confiança 127
13. Revisão
PARTE 4: O SISTEMA NERVOSO CENTRAL
14. Introdução
O Sistema Nervoso Central 134; Os Mochin: uma Visão Cabalística 135; Kéter: a Coroa 137; Chochmá (Sabedoria) e Biná (Entendimento) 138; Dáat (Conhecimento) 140; Criação: o Centro Nervoso 142
15. Intelecto Fiel
Jacob e Esaú 146; O Verdadeiro Intelecto 147; Intelecto Transcendente e Imanente 148; Naassê Venishmá 149
16. Kéter: o Crânio
A Escada Espiritual 152; Kéter e a Paciência 155; As Nove Câmaras 156; Ratson (Vontade) 159; A "Vontade das Vontades" 160
17. Pensamento e Imaginação
O Amalec Interior 163; O Poder do Pensamento 165; Um Pensamento que Produz Humildade 166; Imaginação ou Ilusão 168; Imaginação: a Ponte entre o Físico e o Espiritual 169; Angelical ou Demoníaco 170; As Câmaras das Trocas 172
18. Chochmá e Biná
A Metrópole de Roma 175; Mente Aberta ou Estreita? 176; Memória: Recordação do Futuro... 178; ... e Esquecimento do Passado 180; O Sonho do Faraó 182; Criação Ex Nihilo 183; Noticiário 24 Horas por Dia 184
19. Dáat: o Templo Sagrado 185
Dáat: o Tronco Cerebral e a Coluna Vertebral 186; Aiê? e Meló: Esperança, Não Desespero 187; Os Três Compartimentos 189; A Árvore do Conhecimento: Bem e Mal 191; Doença Mental... 193; ... e Remédios Sugeridos 195; Depressão ou Alegria 197; A Abertura do Mar 198; Dáat: o Templo Sagrado 201
PARTE 5: O SISTEMA CIRCULATÓRIO
20. A Caixa Torácica
A Carruagem de Deus 208
21. Tsimtsum: o Espaço Esvaziado
O Paradoxo da Criação 211; Parada Cardíaca 216; Remédio para o Coração: Fé 217; Oração e Hitbodedut: Meditações do Coração 219
22. O Coração Compreensivo
Biná (Entendimento) 223; Tratamento para o Coração Congestionado 225; Divisão e Discórdia 227
23. A Sede da Emoção
Jerusalém: Temor Perfeito 231; A Chave do Tesouro 233; Alegria 234; Anseio 235; Amor 236
24. O Pulso
A Princesa e o Castelo de Água 241
PARTE 6: O SISTEMA RESPIRATÓRIO
25. Os Pulmões
Um Pulmão Sadio 252
26. A Respiração
O Suspiro 255; A Corda de Segurança 257; O Nariz e a Boca 258; A Traqueia e a Laringe: Constrição... 260; ... E Criação 261
27. Ar Puro
Criação de Almas 263; Poluição Atmosférica 266
28. O Pescoço: Exílio e Êxodo
Descida ao Egito 269
29. Som Terapêutico
Voz 273; Canto 273; Terapia da Fala 275; Lashon Hacodesh: A Língua Sagrada 276; Mashíach 277; A Terra Santa 278
PARTE 7: O SISTEMA NERVOSO PERIFÉRICO
30. Introdução
A Cabeça, a Face e a Testa 284; Os Órgãos Sensoriais 284
31. A Menorá de Sete Lâmpadas
Rosh Hashaná: Tribunais da Mente 287
32. Os Olhos: Janelas para o Mundo
Providência Divina 293; Foco: o Mundo Vindouro 296; Olhando Além 297; O Mau-Olhado 298; O Olhar Lascivo 300
33. Audição, Olfato e Paladar
As Orelhas 303; "Ele Desperta Meu Ouvido..." 303; Fé nos Sábios 305; O Nariz 306; Paciência e Controle 307; O Filtro 308; O "Sentido" da Oração 309; Um Olfato Puro 310; O Paladar 311
34. A Face: a Verdadeira Imagem do Homem 313
A Testa 315; Graça Divina 317; O Êxodo e o Sêder 318
35. Os Pelos: Portais da Sabedoria 320
Os Pelos: uma Introdução Cabalística 321; Os Portais da Sabedoria 321; Calvície 323; A Barba 324; A Beleza do Semblante 326; Os Nove Atributos de Misericórdia 327; As Peot 330
PARTE 8: O SISTEMA LOCOMOTOR
36. Introdução
O Corpo: uma Visão Cabalística 340; O Tronco 341
37. Carne e Osso
Oração e Ressurreição 349; A Carne 350; O Sentido do Tato 353
38. Os Braços e as Mãos
Armas "à Mão": Oração e Fé 355; Mãos Desvirtuadas, Fé Desvirtuada 356; O Poder da Criação 357; As "Três Mãos" 359; Canhoto? 360; As Bênçãos Sacerdotais 362; Os Dedos 363; A Cura Está nas Mãos 364
39. As Pernas
Andar Altaneiro 371; O Ganha-Pão 373; Dança 374; Iessod, o Tsadic 377
PARTE 9: O SISTEMA REPRODUTOR
40. Introdução
Iessod e Malchut: uma Introdução Cabalística 386; Iessod 389
41. A Aliança de Abrahão
A Circuncisão 392; Um Bom Acordo 396; Amor e Casamento 397; Shadai: "Há o Bastante!" 401
42. Iessod: o Tsadic
Um Alicerce Sólido... 405; ... Traz Contentamento à Vida 410; Noé e o Arco-Íris 414
43. O Remédio Geral
O Remédio Geral (Ticun Clali) 418; Sugestões Úteis 420
44. Malchut: o Princípio Feminino
A Lei Escrita e a Lei Oral 423; Torá e Oração 424; Fé 426; Fala 427
45. Eva
O Tesouro 429; Abundância 430; Um Alicerce Puro 432; Renovação: o Ciclo Mensal 433; Pureza Familiar 435; Nutrição 437
46. "Frutificai e Multiplicai-vos"
Dáat 443; Relações Conjugais 447; Concepção 448
47. A Imagem Divina
A Missão 451; O Processo de Purificação 452; Gravidez e Parto 454; Exílio e Êxodo 457; Mashíach ou Aborto? 458; E Pluribus Unum 460; Paz na Terra 462
PARTE 10: VIDA E MORTE
48. "E Era Muito Bom"
O Dia do Juízo 87; Recompensa e Castigo 87
Apêndice A: O Filho do Rei e o Filho da Criada
Apêndice B: O Corpo e as Mitsvót
Apêndice C: As Sefirot e as Características
Apêndice D: Tabelas e Diagramas
Apêndice E: Ticun Clali
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Os Olhos: Janelas para o Mundo
Os olhos talvez sejam os órgãos sensoriais mais importantes. A visão nos apresenta cores e formas - na verdade, o mundo todo que nos cerca. De certo modo, o ser humano é capaz de ouvir, cheirar, sentir sabores e apalpar com os olhos, que lhe proporcionam uma experiência sensorial disseminada que não pode ser reproduzida por nenhum outro órgão (ou seja, através da visão é possível imaginar mais prontamente a reação dos demais sentidos). A visão permite que se veja a maravilha e a beleza da criação física de Deus. Destituídos de visão, nós nos desligaríamos da realidade e seríamos privados do contato genuíno e nítido com o mundo. No âmbito espiritual, "ver" também significa olhar as coisas de maneira profunda com a finalidade de descobrir sua essência (ver Licutê Moharan I, 1:2-4). Sem uma boa "visão", somos incapazes de perceber a presença de Deus a nossa volta.
Em nossa vida cotidiana, devemos ter cuidado para que nossos olhos não enxerguem apenas o que queremos ver, em contraposição ao que de fato existe. Interesses velados podem distorcer com facilidade a percepção, como indica a seguinte injunção da Torá (Êxodo 23:8; Deuteronômio 16:19): "Não tomarás suborno. O suborno cega os olhos dos sábios e perverte as palavras dos justos." Quando a faculdade de julgamento é turvada por motivos escusos, perdemos a capacidade de discernir entre o bem e o mal, entre "absolver o inocente e condenar o culpado" (Deuteronômio 25:1). Mesmo os justos correm o risco de ter suas "palavras pervertidas". E se até os sábios, que possuem uma visão aguçada, podem errar na definição do que veem, com certeza quem tem uma visão espiritual fraca deve ser especialmente cauteloso (ver Licutê Moharan I, 54:5).
A boa visão corresponde a um grau expandido de consciência, conhecimento e intelecto (ver Licutê Moharan I, 74:1). Em termos cabalísticos, os olhos são uma extensão do hemisfério direito do cérebro, que é associado à sefirá de Chochmá (ver Licutê Moharan II, 40:1). Portanto, devemos perguntar-nos: "Como usamos os nossos olhos?" Enxergamos a essência real do que vemos, ou julgamos as coisas pela aparência externa? (Lembre-se de que Chochmá écôach má, a essência da coisa; ver acima, capítulos 14 e 17.) De que maneira podemos alcançar esse "nível puro de Chochmá", o foco e a concentração que nos habilitarão a perceber a essência íntima das coisas?
Quando os olhos se fixam num objeto, as pupilas se dilatam ou se contraem para regular a quantidade de luz que penetra. Esse movimento de dilatação e contração possibilita que os olhos funcionem adequadamente, sem causar danos à retina. De modo semelhante, quando saímos em busca de uma sabedoria espiritual profunda, é prudente que no começo nos limitemos a um nível mais baixo de intelecto. Nas etapas iniciais, convém que nos concentremos nos resultados parciais e não nos objetivos finais, para que o intelecto se "dilate e contraia" de forma natural e possa gradativamente atingir níveis mais elevados (ver Licutê Moharan I, 30:3).
O Rebe Nachman ensinou (Licutê Moharan I, 254; ib. 65:3):
Os olhos defrontam-se constantemente com visões deslumbrantes. Se purificassem seus olhos, as pessoas seriam capazes de ver muitas coisas magníficas apenas com base no que enxergam com a vista. Porém, as coisas passam diante dos olhos com tamanha rapidez que não há tempo para que eles se fixem nelas e apreendam tudo que veem... No entanto, quem é digno pode alcançar um nível mais elevado de visão e tornar-se capaz de vislumbrar maravilhas de extraordinária beleza em toda parte. Como os olhos da maioria das pessoas não são puros, eles não formam o foco de modo adequado e são impedidos de perceber essas visões esplêndidas e admiráveis.
O Rebe Nachman refere-se aqui às visões que são descortinadas pelo olho da mente. Estas visões magníficas não estão reservadas apenas para os tsadikim, que purificaram seus sentidos e atingiram os níveis mais altos de consciência. Na verdade, elas estão sempre presentes em nossa vida, quando estamos acordados e quando dormimos. Os tsadikim conseguem prestar atenção a tudo que acontece porque eles purificaram e afinaram seus sentidos, de modo que podem perceber as coisas num comprimento de onda diferente. Por conseguinte, eles sabem "selecionar o canal" quando uma imagem poderosa ou um bom pensamento lhes vem à mente. Desta maneira, são capazes de "ver" e compreender o que passa diante do olho de sua mente antes que a visão se vá. Os grandes tsadikim eram tão hábeis nisso - seus olhos eram tão puros - que, para onde quer que olhassem, enxergavam coisas fascinantes e entendiam verdades profundas. Como veremos, em muitos casos eles abriam os olhos para grandes verdades justamente quando os fechavam!
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Remédio para o coração: fé
Parada Cardíaca
Um ataque cardíaco pode ter diversas causas. Ele pode resultar da redução do fluxo de sangue que chega ao coração, causada pelo entupimento das artérias que o alimentam. Pode ocorrer também quando o coração, enfraquecido, não consegue bombear o sangue de forma adequada. Esses mesmos fatores de risco estão presentes na dimensão espiritual.
O coração tem um anseio firmemente arraigado de servir a Deus, mas os vasos pelos quais o "sangue" deste anseio deve ser transportado às vezes se entopem ou desgastam. Enquanto a pessoa não se despoja do excesso de "gorduras e colesterol" - desejos materiais - de seu sistema espiritual, os vasos não conseguem suportar a pressão da atividade de bombeamento do coração, e a "circulação sanguínea" fica poluída pelas impurezas dos maus pensamentos. Quando os atos do indivíduo são bons, em consequência de bons pensamentos, o coração permanece sadio. Pensamentos impuros, por outro lado, obstruem o sistema com más ações, provocando um "ataque cardíaco" espiritual.
Uma "parada cardíaca" espiritual pode acontecer quando diminui a determinação do coração de servir a Deus, em consequência de pensamentos impróprios. Estes pensamentos obstruem o coração, impedindo-o de fazer seu trabalho de maneira apropriada, o que leva, inevitavelmente, a um enfraquecimento - às vezes, até mesmo à cessação - da determinação de buscar a espiritualidade.
Como se pode evitar uma parada cardíaca espiritual? A compreensão da natureza da "doença" conduzirá à descoberta da "cura".
Como vimos, a criação tem dois aspectos opostos: o bem e o mal. O coração dá forma e corpo aos pensamentos, possibilitando que as idéias se manifestem. Neste sentido, os pensamentos do homem são análogos ao ato da criação. Sempre que pensamos, devemos perceber que estamos realizando um ato de criação (ver Licutê Moharan I, 49:1). Por causa disso, o Rebe Nachman recomenda que não se deixe que as coisas saiam do controle. Com base no princípio de que tudo na criação tende a buscar sua fonte, ele ensina que o coração (Biná) também procura, por instinto, a sua fonte (Chochmá), de modo que o coração, por natureza, arde com um desejo devorador de servir a Deus. O perigo é que a pessoa queira subir a escada espiritual rápido demais, tentando ir além de suas possibilidades. Isso provoca um esgotamento ou "apagamento" espiritual - quando alguém que ainda não é capaz de absorver o conteúdo dos níveis espirituais que se empenha por alcançar reduz sua devoção; ou quando seu grau de observância das mitsvót é inadequado para a consciência espiritual que ele busca. Neste caso, seu coração desejoso não recebe nutrição prática suficiente para manter-se batendo de modo apropriado.
A cura pode ser encontrada no ato da criação. Deus formou os universos dentro do espaço esvaziado. Para cumprir o propósito da criação, foi necessário formar mundos inferiores, de diferentes níveis, que fornecessem um ambiente ao qual a alma pudesse descer para servir a Deus, apesar de Ele estar oculto. O homem, por sua vez, também funciona em diversos níveis. Seu coração "pensa", e as funções mais baixas de seu corpo traduzem fielmente esses pensamentos em atos físicos. Se os pensamentos provenientes do coração forem bons, os atos físicos serão bons; maus pensamentos, por outro lado, gerarão más ações. A partir do momento em que as boas ações se manifestam, elas mantêm o coração em funcionamento constante, "proporcionando-lhe" um sentimento de realização que fortalece seu desejo de praticar boas ações.
Podemos ver que temos de cuidar de nossos pensamentos com muito zelo, pois cada um deles contém um potencial extraordinário. Bons pensamentos conservam a saúde espiritual do coração, de modo que ele pode continuar "batendo" de maneira equilibrada, ansiando por espiritualidade e, ao mesmo tempo, permanecendo sob controle para que não se "consuma" por ir além de sua capacidade (ver Licutê Moharan I, 49).
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Remédio para o Coração: Fé
As medidas que devem ser tomadas para impedir uma parada cardíaca são assustadoras. Mas as dificuldades para evitar um ataque espiritual do coração são ainda maiores!
Como vimos, o Rebe Nachman ensinou que o coração corresponde ao espaço esvaziado. Neste espaço, há muitas questões que exigem respostas; porém, as respostas nem sempre aparecem. Isto se deve ao paradoxo do espaço esvaziado: "Deus está lá..." "Não está..." "Ele tem de estar..." Reina a confusão, e isto pode deixar o "coração pesado", já que as perguntas que se originam desse paradoxo necessariamente excluem a possibilidade de solução. Como é muito difícil achar Deus nessas indagações, a pessoa deve apoiar-se na fé para "aliviar" o coração sobrecarregado, porque Deus existe até (e principalmente) onde há questões irrespondíveis. Mesmo alguém acometido por um "coração pesado" pode encontrar Deus, desde que se fortaleça com a fé (Licutê Moharan I, 64:6).
Perguntas relacionadas à fé, somadas a outros fardos, como problemas financeiros ou dificuldades em casa, pesam muito sobre o "coração compreensivo". Esta pressão incessante contribui, com muita frequência, para o surgimento de um quadro cardíaco instável. Às vezes, uma simples "mudança de dieta", como a adoção de materiais de leitura que inspirem mais fé do que heresia, é suficiente para aliviar a pressão. Outros casos podem requerer "medicação" - uma dose diária de oração, por exemplo. Infelizmente, há ocasiões em que são necessárias "pontes de safena" ou outras cirurgias de "coração aberto", que obrigam a pessoa a promover uma mudança radical em seu estilo de vida a fim de obter espiritualidade.
No próximo capítulo, veremos que as perguntas podem gerar um coração dividido. O Rebe Nachman ensinou que devemos fortalecer nossa fé para que possamos alcançar um estado de paz interior. Esta paz interior é a resposta para qualquer pergunta herética que surja no coração (ver Licutê Moharan I, 62:2).
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Costuma-se erguer as mãos depois de lavá-las para comer pão, antes de enxugá-las. Quando o faz, a pessoa traz santidade aqui para baixo.
Orach Chaim 162:1; Sháar Hamitsvót, Ekev
Há um versículo que afirma (Salmos 134:2): "Erguei vossas mãos com santidade e bendizei ao Eterno." Isso indica que quando levantamos as mãos até os olhos ou a testa (isto é, a mente), apontando Chochmá, conseguimos fazer descer bênçãos para o coração (Biná) (ver Sháar Hamitsvót, Ekev, p. 91).
O Rebe Nachman ensina que, embora a principal fonte de fé esteja no coração, a fé se transforma em convicção verdadeira quando se espalha pelo corpo todo (Licutê Moharan I, 91). O Rebe explica que seremos capazes de absorver santidade erguendo as mãos se acreditarmos que o ato de levantar as mãos produz esse efeito. É este o significado do seguinte versículo (Salmos 119:86): "Todas as Tuas mitsvót são fé" - devemos crer que, por meio da observância das mitsvót, trazemos a nós santidade dos céus. Desta maneira, estendemos a nossa fé para fora, do coração para as mãos (que são os "veículos" através dos quais fazemos descer influências do Alto). Assim, a pessoa pode espalhar sua fé de modo que o corpo inteiro a sinta e a transforme em fé verdadeira. Quem alcança a verdadeira fé efetivamente eleva seu intelecto a um nível no qual pode compreender de verdade o que antes só sabia pela fé. Este é o sentido da ideia de ser capaz de fazer descer santidade (Chochmá) para o coração (Biná).
A fé fortalece nossa capacidade de enfrentar as tribulações da vida, desde que estejamos dispostos a esforçar-nos para atingir esse nível. Desenvolver a fé não é uma tarefa fácil. Ela envolve o corpo inteiro.