Abraham Joshua Heschel (1906-1972), notável filósofo judeu, voltou sua atenção diretamente para a literatura rabínica tradicional em Torá min ha-Shamaim be-Aspaklaria shel ha-Dorot (A Torá Revelada Apreendida Através das Lentes das Gerações de Sábios), em especial para aquela contida no Talmud, no Midrash e nos comentaristas medievais.
Dessa leitura emerge uma visão dialética das correntes de pensamento que animaram os debates das primeiras interpretações rabínicas sobre questões como o elemento humano e o divino na revelação; a imanência versus a transcendência de Deus; a relação entre observância religiosa e o espírito por trás da observância; a noção de milagre versus a ideia de uma natureza autônoma; e muitos outros temas do debate judaico que têm atravessado os séculos.
Heschel identifica, a partir de duas escolas de pensamento rabínico dos primeiros séculos da era comum a escola de rabi Akiva, de tendência mística, e a escola de rabi Ishmael, de tendência racionalista, dois grandes paradigmas que tensionaram dialeticamente o pensamento rabínico desde o final da Antiguidade e durante a Idade Média.
Essas tendências têm permeado o pensamento judaico e, desde então, contribuído para uma abordagem única no trato da contradição.
A leitura dialética das fontes rabínicas redimensiona a relação entre razão e misticismo na experiência religiosa judaica e, para além de aprofundar o debate moderno sobre a natureza da experiência religiosa, é também uma poderosa crítica contra as leituras fundamentalistas dos textos tradicionais judaicos.
Este pensamento e esta leitura são o objeto de reflexão do rabino e pesquisador Alexandre Leone, em Mística e Razão: Dialética no Pensamento Judaico, que a Perspectiva leva ao leitor em mais um volume da coleção Estudos.