Prefácio à 2ª edição ampliada
Passados 23 anos desde a publicação de meu livro "D. Pedro II: Diário de Viagem - 1876", texto em que apresentei pela primeira vez, de forma sistemática, a profunda relação que Sua Majestade D. Pedro II manteve com o judaísmo, numerosas descobertas foram realizadas. De lá para cá, o interesse pelo imperador foi aumentando, motivando-me a desencavar mais e mais documentos que trouxeram nova luz sobre diversos episódios vividos por Pedro d´Alcântara.
Descobertas históricas e arqueológicas despertaram enorme interesse não apenas no mundo acadêmico, mas também no amplo público, sedento por aprender a cada dia sobre o monarca brasileiro. Naturalmente, essa segunda viagem internacional, empreendida pelo imperador e sua comitiva na segunda metade do século XIX, gerou uma atmosfera repleta de sofisticação, santidade e mistério.
No tenho dúvida de que a região do Oriente Médio e a Terra Santa, territórios desabitados e abandonados pelo Império Turco-otomano, serviram de pano de fundo para que surgissem relatos inacreditáveis, dignos das "Mil e uma Noites".
Gostaria de destacar um momento marcante acontecido durante estes 23 anos. No domingo 2 de setembro de 2018, o Museu Nacional do Rio de Janeiro foi atingido por um incêndio. Uma Torá (Bíblia) estava ali guardada. Dias depois, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) confirmou que nove rolos de pergaminhos da Torá haviam escapado intactos do sinistro que devastou por completo o museu. A Torá estava entre as mais de 200 milhões de peças que faziam parte do acervo cultural da instituição.
Esses manuscritos milenares, conhecidos como "Pergaminhos Ivriim", datam de 400 a 1.000 anos atrás e haviam sido tombados pelo Iphan em 1998, em razão de sua importância arqueológica e bibliográfica. As peças do acervo acabaram escapando das chamas porque, antes do incêndio, foram transferidas para a seção de obras raras da Biblioteca do Horto, localizada nas proximidades do Museu Nacional.
Esta 2ª edição que hoje apresentamos ao leitor visa incorporar boa parte das matérias que fui publicando durante mais de duas décadas, causos sobre figuras que desfilavam ainda de forma discreta na 1ª edição. Para isto, decidimos ampliar consideravelmente a nossa introdução e inserimos na bibliografia textos já lançados, tanto em revistas acadêmicas como naquelas de difusão cultural.
Quatro figuras mencionadas na 1ª edição ganharam maior visibilidade nesta nova: o emir Abd- El-Kader, a lady britânica Jane Digby Ellenborough, o guia franciscano Frère Lièvin de Hamme e o segundo mestre de hebraico do monarca, Karl Friedrich Henning. Na companhia destes quatro importantes personagens podemos também entender a forma pela qual os jornais da Terra Santa divulgaram a visita de Pedro II e sua comitiva, todos destacando seu amor em estudar o hebraico numa época em que esse idioma era considerado uma mera língua litúrgica utilizada apenas no culto da sinagoga.
Finalmente, gostaria de agradecer a todos aqueles que me ajudaram na obtenção de novas fontes nos acervos e bibliotecas, ao meu editor e amigo Jairo Fridlin e à minha querida família, sempre participando e me alentando na busca de novas descobertas.
Prof. Reuven Faingold
Kfar Saba, Israel.
Novembro de 2021.
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Extrato dos AGRADECIMENTOS
Este livro, fruto de pesquisa realizada durante três anos, surgiu com a própria descoberta do texto original do Diário da Viagem do Imperador D. Pedro II à Palestina (Diários 18 e 19, Maço 37v, Doc. 1057), guardado a sete chaves no Museu Imperial de Petrópolis.
Este trabalho pretende contribuir duplamente: primeiro lançando mais luz sobre um episódio inédito da historia brasileira e, segundo, abordar um capítulo desconhecido da história de Eretz Israel (Terra Santa) sob domínio turco-otomano, na segunda metade do século XIX.
O texto estudado é relativamente curto e se caracteriza por uma linguagem narrativa, baseada em parágrafos descritivos e de simples leitura. O número de "estrangeirismos" (expressões em outras línguas, especialmente em francês) é pequeno. A narrativa alterna, de forma arbitrária, a primeira pessoa do singular e a primeira pessoa do plural. Nesta edição, tomou-se a liberdade de corrigir a grafia de determinadas palavras, a acentuação e a pontuação, visando facilitar a leitura do mesmo. Em alguns casos, foram inseridas, entre colchetes, palavras omitidas ou elipsadas.
Somente depois da primeira metade do seu reinado, agitado por revoltas, pela luta no Prata e a Guerra do Paraguai, d. Pedro II empreendeu suas três viagens: a primeira viagem à Europa se estendeu de 25/05/1871 a 30/03/1872; a segunda de 26/03/1876 a 25/09/1877 e a terceira, já doente, começou em 30/06/1887 e terminar em 22/08/1888.
A segunda viagem de d. Pedro, em 1876, ficou memorável pela repercussão amistosa na imprensa internacional. O interesse e a simpatia despertados pelo monarca ficaram gravados através de uma série de episódios vividos com grandes figuras da época, entre eles o inventor do telefone, Graham Bell. Durante 18 meses (540 dias), Sua Majestade visitou os Estados Unidos, para as comemorações do Centenário da Independência, Escandinávia, Rússia, Grécia e o exótico Levante (Líbano, Síria e Palestina). Voltou à Europa pelo Egito, e finalmente atravessou o Atlântico em direção ao Rio de Janeiro.
Esta expedição à Terra Santa revela atribulações de uma viagem prolongada e difícil: momentos de alegria e tristeza, de temor e segurança, de euforia na chegada e de saudades na inevitável hora da partida. Estudar o Diário de Viagem à Palestina permitiu descobrir um perfil diferente de d. Pedro II. Mais do que o monarca preocupado em resolver situações sociais, políticas ou econômicas do país, permanentemente abalado com os problemas da escravidão, conflitos de fronteiras, implementação de recursos financeiros (internos ou vindos do exterior), tudo em benefício de um Brasil Império que pretendia iniciar sua lenta marcha rumo à modernidade, ao longo da pesquisa descobrimos a intimidade de um d. Pedro diferente: estudioso, ávido de conhecimento, curioso e versado em arqueologia, tradutor, educador, pedagogo, culto e erudito.
Concluído o trabalho, pode-se afirmar categoricamente que o maior sonho do Imperador do Brasil era realizar uma viagem de devoção à Terra Santa. Lá, ele comemorou mais de meio século de vida. Somados a estes desejos, o amor pelo hebraico e sua paixão pela Bíblia. Assim, esta viagem de 1876 foi um dos momentos espirituais mais elevados na vida de nosso soberano.
Prof. Reuven Faingold
São Paulo, Erev Rosh Hashaná 5759.
Setembro de 1998.